Sou um cão.
Ou melhor, penso que sou um cão.
E o meu nome é Cão.
Eu sei que é redundante e pouco criativo,
mas o que é que querem,
são coisas do meu dono.
Dizia ele que era a única forma
de não se esquecer do meu nome.
Ele não é má pessoa,
isto é,
para humano,
não é?
Que os critérios de julgamento serão certamente diferentes,
de canídeo para pessoa mas,
se esquecermos o seu aspecto exterior algo repelente,
a sua fragilidade física,
os dentes de pôr e tirar
e a quase total ausência de pelagem
– excepção feita ao ridículo apêndice capilar
que usa entre o lábio superior e o nariz –
tenho que admitir que já vi donos piores.
Não me falta com comida,
ainda que ultimamente venha a abusar da ração seca.
Água à descrição,
cama e almofada lavada.
Pelo calendário do meu dono,
já tenho 1 ano e meio,
um macho (acho que sou macho) adulto
na primavera da vida.
É precisamente este assunto que me traz preocupado.
Aqui há pouco menos de um ano,
o meu dono levou-me ao médico.
A que propósito, não sei.
Sei que um homem enorme
me segurou em cima de uma mesa,
açaimaram-me de forma humilhante
e injectaram-me um líquido numa coxa traseira.
Quase de imediato,
o corpo perdeu a sensibilidade
e depois a consciência total.
Acordei no carro do meu dono,
nauseado e com uma ligeira dor na região abdominal.
Passei dois dias deitado no meu tapete,
água pouca,
comida nenhuma.
Ao terceiro dia,
senti vontade de apanhar um pouco de ar fresco,
cheirar umas árvores,
ladrar aos pássaros.
Alguma coisa aconteceu.
Não me apeteceu cheirar as habituais partes da cadela da vizinha
e o som do meu latido
parecia mais de um gato envergonhado.
Sou um macho, acho.
Outubro 2007
quinta-feira, 4 de junho de 2009
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