quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

EXERCÍCIOS em redondilha maior e rima emparelhada

“Que tarde amena, Filomena!”
“Mesmo bacana, Juliana!”
“Vamos ao jardim, Serafim?”
“Estamos nessa, Vanessa!”

E lá foram, esfuziantes,
os quatro amigos de infância,
de olhos risonhos, brilhantes,
cantando em consonância.

Estavam chegando ao portão
quando passa, ensimesmado,
um outro amigo, o João,
em passo assaz estugado.

“Olá João, vais com pressa?”
logo lhe grita a Vanessa,

“Sim, vou buscar a Juana,
que chegou agora de Havana!”

“Vão ter conosco ao jardim!”,
acrescenta o Serafim,
“vamos cantar e dançar
até o dia raiar”!

E dançaram co’as formigas,
os amigos e as amigas,
desfizeram-se dos trapos
e beijaram rãs e sapos.

Vestiram-se de mil cores
beberam com os beija-flores
néctar e água de rosas
das orquídeas e mimosas.

E p’lo cálice do jacinto
foram três garrafas de tinto
que os deixou atordoados,
e alegres, mas ensonados.

Acenderam uma fogueira
debaixo da amendoeira
e dormiram abraçados.

Eram três dias passados
quando os olhos, ramelosos,
se abriram, esperançosos,
para um dia auspicioso.

Logo o Serafim, ranhoso,
anuncia em tom estridente:
“Tenho que ferrar o dente,
estou com fome, pessoal!”

“E o anticoncepcional?
Ai meu Deus que esqueci!”
chora a Juana, fora de si.

“Vamos mas é ao almoço,
mesmo que seja um tremoço!”
berra o João, esganiçado,
“quero um queijo amanteigado,
filetes de carapau,
um pastel de bacalhau
e duas tacinhas de branco!”

“Aproveito e vou ao Banco
levantar algum dinheiro
para ir ao cabeleireiro,”
diz o Serafim, gaiteiro.

A Filomena, zangada,
vai p’ra cima da bancada,
e grita em tom de falsete:
“Roubaram-me o sabonete!
preciso de me lavar,
qu’inda tenho qu’ir trabalhar
até à nove da noite!”

“Precisas de um bom açoite,
Só agora te lembraste
do que bebeste e cantaste!”
acusou a Filomena
sem qualquer sombra de pena!

Após longa despedida
lá foram todos à vida
de semblante acabrunhado,
cada qual para seu lado.

E assim acaba esta história
sem qualquer dedicatória,
junto apenas um abraço
bem sentido, d’amigalhaço,
e mais um queijo da serra
e saudades lá da terra.

Janeiro 2010

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